domingo, 25 de janeiro de 2009

O carnaval de Maria.


Era um dia anterior ao carnaval, seu dormitório estava sendo restaurado.
Tudo estava no conserto, inclusive seu celular.
Vestiu uma roupa.
Desceu as escadas em busca de um “orelhão”.
Ela não sentia-se diretamente magoada.
Sua angústia havia trocado de lugar com a mágoa.
E após essas misturas de sentimentos...
A apatia privava-lhe totalmente de qualquer sensibilidade.
Alguns sofrimentos – Especialmente os que antecediam às promessas verbais- Acabavam em poucos segundos. O remorso, todavia, não.
As avenidas lotadas de carros, pessoas eufóricas, buzinas e muitas marchinhas.
Gostava de falar caminhando, mas ali ficou naquele objeto preso, fitando seus pés.
Um carro preto estacionou perto do telefone público. Ela desviou o olhar. Logo após, percebeu um braço a enforca-lhe, puxando o fio de suas delicadas mãos. Sentiu um frio na “espinha”, mas era uma arma. Foi obrigada a entrar no sedan preto.

O que está olhando?

Olhou então para os lados. Havia uma calcinha azul no banco do carro.

Vamos dar uma volta!


Pra onde? (Pensou).Chegada a hora da sua morte. Nenhuma mágoa ou ódio.
O desenho era um lugar sombrio. Sem luzes, pierrots, confetes...
Ali ele havia estacionado o carro.

Vamos fazer um pouco de amor!


Calada. De olhos quase fechados. Sem ironia, um pouco talvez.
Devia ser breve. Sem pestanejar. Uma fantasia rodando, verde, rosa, verde, rosa.
Na parte inferior, uma calcinha azul, meia-calça. Seria uma passista? Achava que não. Isso não pode ter significado. Deve ser imparcial.

Usa pílulas?

Não.

É solteira?

Sim, não tinha um namorado.
Disse que falava com a mãe no telefone.
E que jamais falaria isso para alguém.

Vou levá-la de volta ao orelhão!

Com as pernas trêmulas, o vestido desabotoado, com a calcinha na mão. Voltou.
Atravessou a avenida. Nenhuma lágrima dos seus olhos. Correu por entre o Cordão da Bola Preta. As pessoas notavam-lhe surpresas, ainda sem nenhuma lágrima. Um silêncio no bloco.

Subiu as escadas. Foi direto para o banheiro. A água caía, tépida, fitava seus pés.

Ela jamais derramou uma lágrima que fosse. Ninguém soube. Só nós.

Imagem : b1oodlust

Um comentário:

Renan Moreira disse...

Que texto!
Só confirma o teu jeito pra escrever. Sobre contar histórias. Com o teu recado.
E com uma escrita maravilhosa.

Profissional, se esta palavra não soasse tão mecânica diante das emoções que consegue exalar quando escreves.